Texto escrito para meu blog: “O Cronista do Rei”.
- Hm! Eu quero uma xícara de Chocolate Quente.
A atendente logo anotou o pedido numa caderneta de mão e saiu, deixando a moça sozinha na mesa. Camila estava procurando um pouco de alívio para os seus pensamentos, e pensou em relaxar um pouco naquela confortável cafeteria. Era um ambiente agradável, cheirando a grãos moídos de café, e ela adorava.
Ela estava sentada sozinha na mesa que ainda trazia mais um lugar, bem de frente ao seu. Percorreu os olhos pelo saguão e não viu nada que pudesse chamar-lhe atenção. Algumas mesas ocupadas, mas a maioria ainda vazia. Dentro de poucas horas o lugar estaria cheio de pessoas fazendo seus pedidos, conversando e vivendo suas vidas, mas, enquanto isso não acontecia, ela ainda podia ouvir um piano tocar ao som de fundo do ambiente.
Camila, então, passou a olhar pelo vidro; a cidade lá fora parecia estar um pouco agitada: as árvores dançavam ao ressoar do vento frio, que fazia com que todos se agasalhassem, e as pessoas mantinham o mesmo ritmo agitado, de passos, de falas ao celular, e a avenida estava movimentada aquela tarde. Ela conseguia ver o céu, que estava obscurecido por negras nuvens.
Ela passou os olhos no relógio, talvez o seu pedido já estivesse pronto, mas ainda era cedo, e ela sabia disso. Camila buscava acalmar os pensamentos, eles eram altos, a confundiam, traziam esperança e medo ao mesmo tempo. Ela fechou os olhos. Preciso me acalmar, pensou consigo mesma.
Um rosto familiar entrou no saguão e esperou no balcão de atendimento, mas Camila não havia percebido, ela estava de olhos fechados, tentando acalmar-se com leve som do piano. Sentiu alguém aproximar e abriu os olhos.
- Oi?!
Era Sofia. Camila levantou-se e a abraçou. Seria bom ter uma velha amiga para passar o tempo, falar de coisas corriqueiras e de tempos que não voltam mais. Seria perfeito para acalmar os ânimos.
- Como você está? E como vão as coisas? Depois que a gente saiu da escola a gente não se viu mais – disse Camila.
- Bem, você mudou de cidade, como nos veríamos?
E logo Sofia sentou-se no lugar vago e começou a contar de tudo o que aconteceu após o terceiro ano; contou resumidamente, é claro, enquanto a amiga fazia comentários engraçados e as duas riam. A conversa foi interrompida pela atendente, que agora trazia o pedido na bandeja.
- Seu chocolate quente, como pedido.
Camila agradeceu e descansou a xícara na mesa. Voltou-se para Sofia e disse:
- Você não fez seu pedido?
- Fiz sim, e já pedi para que entregassem nesta mesa – Sofia disse sorrindo. Fez-se uma breve pausa, e ela aproveitou para emendar – Foi muito gratificante te ver no culto domingo, Camila; depois de tantos convites que te fiz quando estávamos no colégio. Fiquei muito feliz em te ver lá.
- Eu também fiquei feliz em ir – Camila limitou-se a falar. Ela observava a sua xícara e, rapidamente, olhou para a amiga que, sem graça com a resposta dada, limitou-se a observar o saguão. Camila começou a ficar nervosa, talvez aquela fosse a oportunidade perfeita que ela tanto procurava, mas ela não sabia como falar.
Sofia ia puxar um novo assunto a qualquer momento, e ela não poderia deixar este momento passar. A atendente chegou com o cappuccino de Sofia, e a agradeceu por dentro, aproveitou a deixa e decidiu ser discreta.
- Foi muito bom estar lá. Na verdade, tenho pensado muito naquilo que o pastor ensinou – Camila assustou-se em ser tão clara. A discrição que ela queria não fora alcançada e ela temia que a amiga a estranhasse, mas a única coisa que ela viu foi um grande sorriso abrir-se no rosto um pouco sardento de Sofia.
- Agora fico mais feliz ainda. Mas o que tem feito você ficar pensativa por estes dias?
- Não tenho muita certeza, mas acho que um pouco de tudo. Eu tentei me lembrar qual a passagem bíblica para relê-la, mas não consegui.
- O pastor leu Isaías 53 – respondeu Sofia, logo abrindo um aplicativo da Bíblia em seu celular – Aqui está, amo este trecho bíblico, ele é uma profecia a respeito do preço que Jesus pagou por nossos pecados.
- Bem, isso acho que não compreendi totalmente.
Sofia sorriu.
- “Mas ele foi ferido por causa das nossas transgressões, e moído por causa das nossas iniqüidades;” – Sofia leu e ponderou - Todo o sofrimento que Cristo passou na cruz, Camila, como a coroa de espinhos e os açoites, foi por causa de nossos pecados.
- Nossos pecados?
- Sim, nossos pecados. A Bíblia nos mostra que o salário do pecado, digamos a consequência destes pecados é a morte, não apenas a morte física, mas principalmente a morte espiritual e eterna. E todos nós somos pecadores, Camila, afinal, quem nunca cometeu erros?
Por um momento Camila irritou-se. Será que Sofia conhecia sua história? E, de repente, era como se ela sentisse novamente o clima frio daquela segunda-feira. Suas mãos tremendo, a sirene, os gritos. Ela voltaria no tempo, se conseguisse, mas não foi de propósito, ela pensava... Alguém me ajude, por favor, ela ainda gritava.
- Mas para todos os nossos erros existe uma cura.
Era a voz de Sofia; Camila voltou em si.
- O sacrifício de Cristo é a cura para os nossos pecados, Camila. Deus é perfeitamente justo para deixar nossos erros sem punição, mas essencialmente amor para não nos ver pagar por eles. Por isso Ele mesmo veio ao mundo, a fim de saldar nossa dívida e nos libertar da prisão do pecado. Assim ele nos perdoa e nos recebe como filhos.
- Perdoa?! – Novamente Camila assustou-se por sua falta de discrição. Envergonhada, ela tomou um gole de chocolate quente, até poder ler a dúvida no rosto da amiga; então acrescentou – Não consigo crer em alguém que possa perdoar assim, e ainda sofrer o dano por alguém que apenas tenha errado.
- É por isso que Ele é o único Deus verdadeiro, e este é mais um motivo para O adorarmos – Camila podia sentir a genuinidade fluir das palavras da amiga – Ele nos amou quando ainda éramos pecadores, e morreu por nós sendo nós ainda errados, e nos oferece perdão.
- Sofia, não me leve a mal, por favor, mas você acha que... que Jesus morreu... – era difícil conter a emoção, então ela engoliu o choro com um gole de chocolate quente, e terminou - ... Ele morreu até mesmo por mim?
- E por que por você? – ela voltou os olhos para o celular e leu - “Todos nós andávamos desgarrados como ovelhas; cada um se desviava pelo seu caminho; mas o Senhor fez cair sobre ele a iniquidade de nós todos.” Isaías 53:6
Uma lágrima que Camila não pôde conter escorreu pelo seu rosto. Estra era a respostas que ela havia buscado tanto tempo. Novamente ela sentiu o gelado clima, era como se ela estivesse lá novamente, o medo começou a tomar seu coração quando ela ouviu Sofia dizer:
- Sim, Camila, Jesus morreu por você.
Camila voltou seus olhos para a xícara, que estava quase vazia; o cappuccino de Sofia já havia acabado. Ela levantou os olhos e sorriu para a amiga que, tão carinhosamente, lhe compartilhara a Verdade. Camila levantou-se e abraçou Sofia ali, no meio de todos que nem perceberam nada acontecer.
- Muito obrigado – ela sussurrou enquanto ainda estavam abraçadas.
Sofia estava muito emocionada, não esperava terminar a tarde tão bem, mas o fato de a tarde estar terminando lembrou-lhe que um compromisso a aguardava. Ela precisou sair e, com muita insistência, deixou sua conta para que a amiga pagasse.
Camila sentou-se novamente, aliviada por um fardo descarregado. Ela tomou o último gole de chocolate que, a este ponto, já não estava tão quente, e olhou novamente para o céu onde, entre negras nuvens, a luz brilhou.