– Tá gravando?
– Sim, podemos começar.
– Amigo ouvinte, estamos aqui com o empresário Diógenes Skrauts, dono da maior indústria de infláveis do país, que responde por mais de 80% da produção de joões-bobos brasileiros. Tudo certo com o senhor?
– Tudo bem. Satisfação enorme em participar do seu programa.
– Bom, minha primeira pergunta é sobre o carro-chefe da empresa. Sabemos que o boneco produzido por vocês é um clássico, porém levando em conta o perfil da crianças de hoje, é preciso admitir um certo envelhecimento do produto… A impressão que dá é foi-se o tempo.
– Correto. Tanto que a versão clássica nem existe mais. A crise e as mudanças nos hábitos de consumo nos levaram a novos públicos e nichos de mercado. Joões-bobos caracterizados de políticos, de Presidente da República, de Judas (vendas sazonais para sábados de aleluia), de jogadores de futebol decadentes, enfim… Produzíamos também um modelo em que você tinha a opção de colocar rostos de desafetos, para socar à vontade.
– E aí?
– E aí que foi um furo n’água. Ou melhor, no joão. Mas não nos demos por vencidos. Naquele mesmo ano de 2005, nosso Departamento de Marketing sugeriu o lançamento do Seguro joão-bobo, que garantia a manutenção e o conserto dos bonecos em caso de furos e cortes, pelo período de 48 meses. E sem taxa adicional. Era um plus, compreende?
– Bom, imagino que isso tenha livrado vocês da bancarrota.
– Que nada, meu caro. Quanto mais usos alternativos nós concebíamos e implementávamos, maior o tombo mercadológico.
– A recessão parece ter nocauteado em cheio os bonecos… E depois dessa série de infortúnios, apareceu alguma ideia redentora que conseguisse reerguer a empresa?
– Pois é, foi quando nos ocorreu um caminho diferente, atrelando o joão-bobo ao processo educativo – mais especificamente às conjugações verbais, que é um verdadeiro “calcanhar de aquiles” pedagógico. Na embalagem de cada joão-bobo, a criança encontrava um livrinho de bolso com todas as conjugações dos principais verbos, para auxiliá-la na escola.
– Não sei, isso também me parece pouco atraente.
– É, tínhamos esse risco em mente. Afinal, uma criança recorre ao joão-bobo para se divertir, não para lembrar da escola… Mas decidimos arriscar, lançando o joão-sabichão. Óculos de fundo de garrafa, semblante inteligente, jeitão de CDF. Estampado nele, a conjugação de “joão-bobar” no presente do indicativo: Eu joão-bobo, tu joão-bobas, ela joão-boa, nós joão-bobamos, vós joão-bobais, eles joão-bobam.
– E deu certo a empreitada?
– Creia-me: foi um tempo de vacas gordas. Bem gordinhas. Na verdade, a venda para a criança, pessoinha física, não deslanchou. Porém, elaboramos um sofisticado sistema de proprinas com alguns colégios das redes pública e particular no Rio Grande do Norte, inserindo o joão-sabichão como recurso didático em sala de aula. Entretando, após um bom período de curva ascendente, as vendas foram minguando, a coisa deixou de ser novidade. Nossa mais recente investida foi lançar o joão-bobo à base de troca e o ecologiamente correto.
– Fale mais sobre isso…
– No caso do joão à base de troca, o consumidor traz o seu joão estragadinho à loja e ganha um superdesconto na compra de um novo. Já o ecologicamente correto é produzido com material biodegradável, não agredindo o meio ambiente no hora do descarte. A ideia é introduzir nas lojas um joão de personalidade esperta, antenado nas novidades e na preservação dos recursos naturais… isso está na ordem do dia!
– Aí sim, heim…
– O slogan é “De bobo, esse joão não tem nada”. Semana que vem, estaremos analisando os primeiros relatórios de vendas. Dependendo do desempenho, criaremos novos modelos ou encerraremos de vez a produção.
? – Boa sorte, e obrigado pela entrevista!
– Eu é que agradeço.
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